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coitadinhodocrocodilo



Sexta-feira, 30.11.12

Miséria de soluções

Estima-se que um quarto da população portuguesa corre o risco de se tornar pobre (isto, se excluirmos os apoios sociais). Pobre, não miserável. Parece haver um debate social sobre a diferença entre pobreza e miséria.

A pobreza analisa-se olhando para a família onde estamos inseridos. Casal desempregado? A mais de meio caminho para a etiqueta da pobreza. Entende-se por miséria, a situação em que a pessoa ganha menos de 3700,00 EUR/ano.

Mas o desemprego não é única ou a principal causa dos milhares de novos pobres. O endividamento não permite que as pessoas se adaptem aos novos rendimentos e avancem com as suas vidas, agora não só desprovidas de luxos, mas também de bens essenciais. Na Grande Lisboa, um terço das crianças do ensino básico público tem carências alimentares.

O consumo é essencial para mover a economia, mas o consumismo exacerbado asfixia a sociedade. Mais cedo ou mais tarde pagamos a factura. Insurgem-se contra a Jonet por negar miséria em Portugal. Saiu-lhe mal a declaração. Ela deveria ser das pessoas que mais sabe sobre pobreza e miséria no nosso país.

Eu e tu podemos fazer caridade, é essencial nos tempos que correm. O Estado, esse, tem responsabilidades muito superiores. Os apoios sociais, que são vistos como uma despesa, deviam ser encarados como um benefício, um investimento. Se o Estado suporta a educação de uma criança, deve esperar dela o seu contributo anos mais tarde. Mas o Estado português não pensa em décadas, pensa em conjuntos de quatro anos e isso faz toda a diferença.

Por isso, libertem-se de preconceitos, de preguiças, de comodismos e arregacem as mangas. Não são precisas campanhas de solidariedade. Olhem e vejam. São verbos com significados distintos. Ajudem o próximo: o familiar que passa mal, o vizinho que só come sopa, o colega de trabalho que já não almoça…

Um povo com fome é um povo vulnerável, facilmente manipulado. Hitler prometeu acabar com a fome.

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por coitadinhodocrocodilo às 11:50

Sexta-feira, 30.11.12

A crise de objectivos

Durante anos estive sentada em secretárias com telefones, headsets e muitos números à frente. Sentia falta das letras, de textos em forma de desabafo. Com o passar dos anos, as palavras levaram mesmo sumido da minha vida, deixaram de bailar na mente, aguardando a sua transmissão para um documento Word ou um e-mail e apagaram-se. Restou a linguagem técnica, própria da profissão.

A escrita vinha apenas em situações de grande crise, uma espécie de Banco Alimentar Contra a Insanidade Mental. Foi assim em 2007, quando escrevia desenfreada ao som de Metallica para não ouvir o meu filho chorar e mandava mails aos colegas de trabalho para se divertirem. Eles riam-se e eu mantinha a lucidez.

Voltou a crise. Abracei-me às minhas palavras, como se não as visse há décadas, mimei-as e prometi-lhes amor eterno. A crise voltou mais forte, minou as ideias e os ideais, o dinheiro, o emprego, os valores e a abundância. Restam-nos duas coisas que não nos vão tirar: esperança e dignidade.

E não era de esperar? Pensamos sempre em deixar um mundo melhor para os nossos filhos, mas esquecemo-nos que a nossa obrigação é formá-los para melhorar o mundo.

Uma criança que não cresça rodeada de mimos, regras e respeito pelo próximo, dificilmente terá bom senso e serenidade. A sociedade dirige os seres para a única ambição de vencer e “ser alguém”, em vez de incutir objectivos simples como ser feliz e melhorar o mundo. Assim, dificilmente as criaturas crescem a respeitar o que é de todos.

Imaginem o que seria de Portugal se metade da nossa classe política tivesse tomado suplementos de mimo e respeito pelo próximo…

 

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por coitadinhodocrocodilo às 10:32

Quarta-feira, 28.11.12

Baby Star Wars

Há já uns dias que passo umas 18 horas/dia a ouvir tossir. Constipação viral, virose, tosse cavernosa, eu sei lá! Ontem passei minutos sem conta com o bebé ao colo a tentar acalmar-lhe os ataques de tosse e, ao mesmo tempo, a satisfazer-lhe o desejo de mimo.

Hoje é o terceiro dia em casa com duas criaturas que se movimentam apoiando-se nos quatro membros. É engraçada a empatia entre os dois. Um ladra, o outro faz sons a imitar. Um acorda da sesta, o outro arrebita as orelhas. Quando é a vez do cão dormir, o outro vai lá e dá-lhe uma cabeçada (aprendeu que pode dar “turras” ao cão sem que ele se chateie).

Mas descobri que há uma criatura que supera o cão quando se trata de alegrar o bebé (para além de mim, claro!). Fiz esta descoberta enquanto o carregava para trás e para a frente na sala e lhe fazia festinhas no peito. Sempre que passava do meio da sala para o lado da janela, ele começava a chorar. Voltava para trás e, entre os ataques de tosse, ele abria o sorriso mais lindo! Andei assim umas quantas vezes até tentar perceber o que tinha de tão entusiasmante o lado nascente da sala. Entre livros de Lobo Antunes e do Tintin está o Yoda!

Para quem não sabe, o Yoda é uma das personagens mais carismáticas da grandiosa história de cinema Star Wars. Pequeno de tamanho mas grande em sabedoria e força, este velho mestre Jedi, de 900 anos e problemas de sintaxe, reside numa das prateleiras da minha estante. Em forma de peluche, claro! Ao lado, o também grande, mas obscuro de ideias, Darth Vader, e ainda uma réplica de um Clone.

Mas foi com o Yoda que ele engraçou e eu estou no céu! É possível que só um fã de Star Wars compreenda a minha alegria: o meu filho mais velho antes dos três anos já conhecia Lord Vader e a sua marcha imperial (chamando-lhe carinhosamente Duarte Vader). Este, antes de completar um ano, consegue reconhecer a imagem e o nome do maior guerreiro da galáxia Star Wars. Missão cumprida. Agora só falta convertê-lo à religião sportinguista…

Entretanto, arranjo força para continuar a carregar nove quilos para trás e para a frente. Mas como diria o Mestre: “Aliada minha é a Força. E poderosa aliada ela é.”

 

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por coitadinhodocrocodilo às 13:37

Terça-feira, 27.11.12

Facebookiana

Perante a absoluta surpresa dos meus amigos, decidi tornar-me utilizadora das redes sociais (não era ainda por não me fazer grande falta) e da blogosfera (neste caso, era por falta de tempo preguiça comodismo).

Quando pensei em iniciar-me nessas lides, o meu computador apanhou um vírus, daqueles que só a formatação resolve. Aí vai ela para uma loja de informática, com ar entendido, a pedir a limpeza do bicho. Ao balcão, estava um rapaz novo, simpático e muito sabedor do seu ofício. Esta última característica é que faz a diferença, claro!

Foram anos sem conectar-me (desta forma) com os meus amigos e conhecidos e, de repente, uma semana sem computador parece uma eternidade. “Francamente, agora que eu mais precisava!”

Uma semana depois, lá fui eu buscar a máquina. Lamuriei-me que precisava do computador para escrever (o meu filho todos os dias me pede para escrever aquela história e eu ainda não a inventei…). A conversa a correr lindamente, até ao ponto em que me pede para botar um Like (adoro esta expressão) na página da loja no Facebook. Encolhi-me toda e murmurei que ainda não me tinha registado…

“Deixe lá!, disse quase a gritar, "A minha mãe também não!”

Pahhh! Uma pancada na cabeça. Fiquei meia tonta, mas respondi com o tom mais azedo que consegui: “Oiça lá, eu não tenho idade para ser sua mãe!”

“Deve ter quase quarenta… Mas olhe que a minha mãe também ainda é nova! Vai ver que é giro. Tem jogos e tudo...”

Pahhh, pahhh, pahhh! Espancamento público! Estou no chão, não me aguento. Saí porta fora, com o ego a cambalear.

O que valeu ao jovem foi ser sabedor do seu ofício. A mim, foi ter um computador limpinho onde me pudesse registar.

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por coitadinhodocrocodilo às 13:45

Segunda-feira, 26.11.12

Simplificar

Disse Fernando Pessoa que o melhor do mundo são as crianças. Bastava-me entrar num restaurante e calhar ao lado de um casal com filhos para pensar como foi possível alguém ter escrito uma coisa dessas sobre crianças e não, por exemplo, sobre cães! 

Antes de ter filhos nunca lhe dei grande razão. Ainda que esses sentimentos não tenham de todo desaparecido, consigo sentir grande apreço por essas criaturas pequenas. Têm qualidades que reconheço nos cães: aprendem depressa e por imitação, saltam de contentes quando os levamos à rua, dão-nos beijinhos quando lhe oferecemos guloseimas e conseguem sempre surpreender-nos.

As crianças vêm com alguns bónus: falam, têm humor (negro, mas têm! Só riem de quem cai e se aleija…) e vêm munidos de um super-poder: a maravilhosa capacidade de simplificar as coisas. Se juntarmos então o facto de esta ser do sexo masculino, este poder consegue duplicar!

E é um exemplo desse super-poder que quero partilhar. Uma das situações que aguardava com mais expectativa era o momento de explicar ao meu filho de cinco anos que já não tinha trabalho. Não era coisa que me tirasse o sono, (esse, quem mo tira é a criatura mais pequena cá de casa), mas andava com dúvidas de como abordar o assunto. Resolvi esperar que ele o fizesse. Não tardou. No segundo dia perguntou: “Mãe, hoje não vais trabalhar?"

“Não, fico em casa.”

“Mas não me vais buscar cedo, eu quero brincar com os meus amigos!”, alertou logo.

Pois claro, eu aqui a consolar-me pensando que, pelo menos agora, ia ter tempo para os meus filhos e ele vem com regras bem definidas. Ficámos por aqui. 

Esta conversa não o satisfez e o grande dia enfim chegou. Vínhamos de carro da escola para casa e ele atira: “Porque é que já não vais trabalhar?”

“Já não vou trabalhar mais para aquele sítio, agora fico em casa. Mas assim deixo de ganhar dinheiro”, disse tudo de uma vez para ver como ele processava a informação.

“Então, se quiser alguma prenda tenho que pedir ao pai?” (Lá está, o início da simplificação).

“Podes pedir aos dois”. Na cabeça dele esta resposta não fez grande sentido. Por isso, continuei: “Fico em casa a escrever histórias para ti”.

“Que bom!”

“Tens mais alguma pergunta?” até tremi pelo que podia vir a seguir. Como ia responder sem dizer demasiado?!

“Sim. Quando é que saímos do carro que eu quero fazer cocó?”

Muito bem. Não me lembraria de terminar assim uma conversa deste teor, mas não me desagradou. Eu disse-vos: se juntarmos a maravilha de ser criança ao facto de ser do sexo masculino, tudo fica mais simples!

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por coitadinhodocrocodilo às 13:22

Segunda-feira, 26.11.12

Fecha-se a porta...

“Tem uma mensagem nova”… Fui ver. Era o desemprego. “Bolas, agora vem por e-mail?”, perguntei surpreendida.

“Ah, pois, e não vir por uma rede social e seres obrigada a “botar” um Like, já tens muita sorte!”, diz a Almeida.

Foi assim que soube que ia ficar sem emprego. Eu e umas boas centenas de “alguéns”. Catorze, dezassete, vinte, trinta anos de trabalho, fiel ao mesmo empregador. Recebe-se uma mensagem por e-mail e já está: “deixou de haver lugar para si”.

Durante uma semana, evita-se olhar para a caixa de e-mail, não fosse o diabo tecê-las. Mas nesta história o diabo tem nome, cara e responsabilidade. Já as centenas de “alguéns” são anónimas, gente sem rosto, marcadas com um número (esse sim único!). Gente com família, com contas para pagar, com futuros pensados e sonhos acalentados.

Ora, se as pessoas fossem números, não lhes chamávamos “pessoas”. Mas há sempre alguém disposto, em troca de uns tostões, a esquecer tudo o que aprendeu na faculdade para aplicar o que pode facilmente aprender lendo um dos livros de J K Rowling: transformar as pessoas em números.

Mas aqui vamos humanizá-los, dar-lhes alguma vida. E porque não gosto de números, mas de palavras e gentes, arrisco-me apenas numa estatística: a maioria dos “alguéns” são mulheres, com filhos: a divorciada com três filhos, a casada com o marido desempregado, a mulher do que ainda lá trabalha, a que pariu há menos de um ano.

Gente que, ao fim de décadas, vai começar de novo, não do zero, porque carrega às costas experiência (de produzir mesmo sem recompensa, experiência de sorrir quando não tem vontade, de levar o filho à escola com febre para evitar falatório).

Este fechar de porta será um abrir de janela, uma janela de oportunidade. Reflectir sobre o que se fez e o que se quer fazer, o que se foi e se queremos realmente continuar a ser.

Agora vou fazer parte da estatística, agora vou ser uma das muitas preguiçosas, como lhe chama o Governo, que não trabalha porque não quer. Coitadinho do Crocodilo.

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por coitadinhodocrocodilo às 10:30


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